segunda-feira, 25 de abril de 2011

Escolas

     Na verdade,
     Não sei nada
 Tento de um tudo          
                                    Estudo          
Ex-tudo          
X-Tudo          

     Uma porção de batatas
     Mostarda e mais nada.
     Contudo, na(da) verdade:
     Não sei nada
Por tudo nado e só          
Água de estrela          
Ex-trela          
X-Trela          

     Não mudo nem emudeço
     Não sei nada nem sou tudo
           Por enquan'tou sortudo

Instinto desextinto          
Instudo insapiente          
A verdade humana vale menos que um instante          

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O fim da ladeira

Da geométrica Avenida dos Impacientes, saltavam ramificadas todas as ladeiras da cidade filhote. Belo era, da sacada, assistir o nascer diário do astro como em poltrona nivelada de cinema, até a vista se averiguar somente no prédio mais próximo da avenida e, portanto, tocante de céu. Os ares eram quentes, tropicalíssimos dessa terra de palmeira e sabiá. Moleque que é moleque se estrepa quanto for, mas não deixa de mostrar joelhos no vestir-se, questã de honra e clima. Em contraponto, ontem nasceu branco -branquíssimo o dia - diazíssimo, mais ou menos dízimo. A névoa cobria vista e telha, pastoreando em multidão. O moleque girou a chave e guardou no bolso, que sábado é dia de saco cheio de pão, cheiroso, pra mãe pai irmão vira-lata que ganha o miolo sem gosto. Morava no fim da ladeira, como se fosse fim de poço sem parede - lá, em tempos de maracujá, tem os ventos mais ventantes, quase rodagigante. A névoa grossa impedia a descida do cheiro de forno que costumava guiar o menino. 

Foi sem medo (era moleque!), a careca leitosa procurando bússola e placa de rua. A contragosto da Senhora Sua Mãe, partiu em blusão de dormir, todo branco mas com uma ou outra mancha de baba seca. Era cem por cento algodão e outrora fazia parte do uniforme escolar do irmão mais velho, agora já letrado. O irmão era bem touro, andava em quase marcha e tinha a coluna nos trinques. De uniforme, então, era o orgulho da mãe, que não tivera tal sorte para gabar-se. Irmão cresce ali, cresce mais um pouco, termina ginásio, todo um baú de vestuário se abre pro moleque, que saíra à feia névoa metropolitana arrastando as pontas da blusa pelo concreto arranhado. As canelas raquíticas tropeçavam no algodão, enquanto o enrosco do tecido chegava nos dedos do pé, que empunhavam o encardido dos chinelos. Gostava de bola e de bafo, de gude e garoa, mas ainda fazia cara feia pr'as meninas da mesma idade. Bastava uma delas passar, com abraços à boneca, e o moleque era língua pra fora, careta completa.

Pisava passo bruto meio inóspito, olhando enfezado à meteorologia que, metida, acha que é quem para impedir o futebol dos sábados de sol? Adentrou-se no monstro névoa como se pão fosse pérola. A blusa, pesada, se encharcava por mágica, que neblina não tem nada que virar chuva, ora essa! A padoca do Seu Benedito era três quarteirões subindo ladeira, sabe-se lá porém qual das três paralelas levava caminho correto. Não barulhos de porteiro, não sabiá em portinhola, não brinquedo não papagaio não rabiola. A névoa é sussurro de talvez, é não sei, possa ser. Névoa é poça com viés de olhar, um tico mais séria que a dos fins de garoa, que meninada pisa sem  dó nem piedade. Dava um pouco de cegueira externa, num lembrete de papel manteiga, mas - ai caramba, nunca vi na minha vida uma neblina trancar em casa todos moleques da rua. O pequeno matutava e matutava, no caminho do pão fresco. Já ia tocar a campainha do menino mano seu, quando botou reparo na farelice de neblina que umidecera a ponta de seu nariz. Rubra, cor de macarrão de domingo, se estendia feito raiz de árvore pelos ares desertos da ladeira. Névoa do vermelho mais concrético, cor de sangue e, assim sendo, cor de peito de moleque. Ele baixou os olhos e nem nada disse. A névoa tapava fala e audição. O cheiro do pão se aproximava leviano, rumando o pequeno travesso, enquanto família abria a porta aos moleques da rua para chorar apertados o caixão branco, todo branco, na glória de mais um moleque que nada tinha a ver com as histórias enroscadas do fim da ladeira.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Iracema em 50 palavras

Tudo isso é muito simples, minha gente: a mina é virgem e bonita e toda morena e é tonta de paixonite pelo branquelo que finge que ama mas na verdade só esnoba a coitada. É que, vejam bem, literatura é muito legal mas, convenhamos: romantismo é um pé no saco.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Requadrilha

João tinha uma quedinha por Teresa, que tinha uma quedinha por Raimundo,
que tinha uma quedinha por Maria, que tinha uma quedinha por Joaquim,
que tinha uma quedinha por Lili, que não era caidinha por ninguém.

Cada um seguiu seu caminho e ficou bem (na medida do possível) porque, afinal, de quedinha em quedinha ninguém cai no chão.

sábado, 9 de abril de 2011

Quase Sampa

O canto do pássaro
O vento levou
Foi voar lá no sertão
E na cidade de meudeus
Sobrou só nota musical

Cidade metrópole de pombos
Sem cais de poesia
Sem tom, sem hora ou compasso
Cidade de círculos tortos
Metrópole sem clave de sol

Metrópole de portas fechadas
Bolsas fechadas
Bocas fechadas
Tempos cerrados

É aqui entre pedágios
Entre o massacre da roda no alfalto
Entre o salto trincado e o brinco perdido
É aqui que pratico minha saúde

Aqui não no cotovelo da cotovia
Mas na goela aberta da avenida
Que meu céu da boca ecoa
O tracejado vermelho da bandeira entre vácuos

Aqui vivo de quase amores
Nas janelas de ônibus
Nas vielas sem flores
Na baldeação de contos

Amo em amarelos de semáforo
No quase do vermelho ao verde
Que é só detalhe

Quase amo na linha do trem
Em calçada apertada
Em raro vintém
Em garoa que estraga programas
E prossegue a luneta dos poréns

Amo num tamanco de átimo
Num tanto instantâneo
Ou amo aos pouquinhos
Sem dramas e piedades
Só cílios e arcada dentária

Amo em quase ladeiras
Tanto amor na falta de verde
Das quase madeiras
Brincadeiras sujeiras focinheiras
Tanta mosca varejeira

Vivo de quase amores
No estômago paulista
Porque todo olho é bonito
E porque arranjo companheiros

Vivo de quase amores
Porque é tudo quase grande
É amor em crase mútua
Quase amo em tanto amor
Como o quase-quase pranto
Da árvore que lacrimeja
Mas não deixa cair frutos

Quase amo em bastantes
Porque se quase desamo
Num piscar de olho e poste
Nunca mais paro de amar
É quase sampa
É Sampamor!